A utilização de perguntas como meio prático para o autoconhecimento está presente no Espiritismo desde a época de Cristo, desempenhando importância muito relevante no progresso dos seguidores de Jesus. A palestra realizada no dia 17 de junho de 2021 nos canais digitais da Associação Espírita Fé e Caridade nos convida a refletir e pensar sobre o autoconhecimento e o que temos feito para nosso crescimento interior.

O Autoconhecimento

Para iniciar as discussões, faz-se necessária uma compreensão mais ampla sobre o conceito de autoconhecimento sob a óptica da Doutrina Espírita. 

Em uma primeira análise, a palavra Autoconhecimento pelo dicionário significa “conhecimento de si próprio, das suas características, qualidades, imperfeições, sentimentos etc; que caracterizam o indivíduo por si próprio”. Somente com essa visão, não pautada na imortalidade da alma, já é possível observar que o autoconhecimento fornece as condições necessárias para nos reconhecermos como seres individuais.

Ainda, ampliando esse conceito, podemos recorrer à definição revelada pelos Espíritos em O Livro dos Espíritos:

919. Qual o meio prático mais eficaz que tem o homem de se melhorar nesta vida e de resistir à atração do mal?
“Um sábio da antiguidade vo-lo disse: Conhece-te a ti mesmo.”
[…]
“O conhecimento de si mesmo é, portanto, a chave do progresso individual.”

— O Livro dos Espíritos, questão 919.

Dessa forma, pensando no contexto do Espírito imortal, o autoconhecimento é uma ferramenta importante para a evolução. Ainda, Joanna de Ângelis complementa essa definição afirmando que:

“[…] o autoconhecimento desempenha relevante papel no adestramento do ser para a sua superação e perfeita sintonia com a paz”

— Autodescobrimento, uma busca interior, Capítulo 1.

Dessa forma, podemos entender o Autoconhecimento como um meio ou uma ferramenta utilizada com a finalidade de melhoria do Espírito imortal e lapidação das imperfeições individuais. Isso ocorre por meio de uma busca particular no íntimo da consciência. 

Jesus e o Autoconhecimento

Entendendo a definição de Autoconhecimento, é sempre importante recorrer ao mestre e guia Jesus para continuar as reflexões pautadas na Doutrina Espírita. O Cristo trazia a importância do autoconhecimento/autodescobrimento por meio de parábolas, reflexões ou diálogos, visando aproximar as verdades imortais do contexto moral e espiritual da época.

Alguns exemplos podem ser encontrados por meio das parábolas anteriormente citadas. Por meio de situações colocadas com personagens, Jesus nos convida a nos colocarmos no lugar de cada personagem apresentado, reconhecendo defeitos ou virtudes em comum. Com isso, a proposta de autoconhecimento ficava implícita em todos os seus ensinamentos. 

Ao revelar as verdades imortais, o Cristo propunha uma autoanálise, visando a construção de valores morais do Homem de Bem. Como exemplo dessa análise de parábolas, podemos investigar duas parábolas:

  1. Parábola do Semeador
  2. Parábola do Bom Samaritano

Na parábola do semeador, diversos tipos de solo são colocados como uma comparação de nossas ações perante a semeadura das verdades imortais, bem como um semeador, representando a necessidade interna de continuar essa semeadura divina. 

No caso da parábola do bom samaritano, alguns personagens são colocados frente à uma oportunidade da prática efetiva da caridade, fornecendo modelos do que devemos ou não nos portar em tais situações.

Ao nos colocarmos no lugar do semeador ou do samaritano nesses exemplos, Jesus propõe a análise de nossa consciência, buscando entender nossas imperfeições a partir de situações externas.

Leis Divinas e o Autoconhecimento

Vale lembrar a revelação feita pelos espíritos em O Livro dos Espíritos:

621. Onde está escrita a lei de Deus?
“Na consciência.”

— O Livro dos Espíritos, questão 621.

Dessa maneira, Jesus nos propõe a necessidade do autoconhecimento, visando uma análise de nossa consciência que, por sua vez, propicia condições de entrarmos em contato com a centelha divina que existe dentro de nós. Por meio dessa análise, encontramos, de alguma forma, as Leis Divinas, nos despertando para a necessidade de reparar atitudes e entrar em conformidade com essas Leis.

O Autoconhecimento e evolução

Ampliando nossas discussões, podemos recorrer à Joanna de Ângelis, no livro Autodescobrimento, uma busca interior:

“No inevitável processo da evolução do ser, o despertar da consciência abre-lhe as percepções para a realidade de si mesmo, e o consequente entendimento dos objetivos da existência corporal. […]”

— Autodescobrimento, uma busca interior, Capítulo 5

Nesse trecho, Joanna nos atenta em relação à necessidade de atendermos o chamado de interiorização e autoanálise. Com isso, passamos a perceber diferentes camadas dentro de nós mesmos. Percebemos virtudes e vícios, qualidades e defeitos. No entanto, isso faz parte de nossa bagagem espiritual imortal. 

Assim, passamos a entender as qualidades como meios de ajudar os outros à nossa volta, mas também a importância de corrigir nossas imperfeições. Joanna segue afirmando que:

“[…] Imediatamente, a necessidade do autoconhecimento constitui-lhe um desafio que deve ser vencido a esforço tenaz, porquanto lhe propiciará a identificação dos recursos intelecto-morais disponíveis e dos prejuízos comportamentais que decorrem dos vícios e paixões primitivas, remanescentes dos níveis de sono e de indiferença ora ultrapassados. […]”

— Autodescobrimento, uma busca interior, Capítulo 5

A autora espiritual evidencia o autoconhecimento como um processo penoso. Não é fácil se deparar com todas as falhas, dessa ou de outras vivências. No entanto, esse mergulho na consiência permite que entremos em contato com essas bagagens espirituais, entendendo de forma mais profunda nosso Espírito imortal. Ainda:

“[…] Conhecidos os próprios limites íntimos e as ricas possibilidades diante de si, ampliam-se os horizontes do discernimento e as opções pela libertação dos atavismos perniciosos, ensejando-o avançar, mesmo sob a imposição de sacrifícios.”

— Autodescobrimento, uma busca interior, Capítulo 5.

Com essa afirmação, Joanna traz a esperança de que existe uma libertação após esse processo de autodescobrimento. A autoanálise permite uma expansão de nossa visão, compreendendo mais efetivamente as verdades eternas (Leis de Deus) presentes em nossa consciência. 

Meios para atingir o Autoconhecimento

Entretanto, surge a questão de como conseguimos atingir esse estado de autoconhecimento comentado anteriormente. Para responder essa pergunta, podemos recorrer ao Livro dos Espíritos, na pergunta 919, em que Santo Agostinho relata o meio prático para atingir o autoconhecimento:

“Fazei o que eu fazia, quando vivi na Terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciência, passava revista ao que fizera e perguntava a mim mesmo se não faltara a algum dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. […] Dirigi, pois, a vós mesmos perguntas, interrogai-vos sobre o que tendes feito e com que objetivo procedestes em tal ou tal circunstância,[…] Perguntai ainda mais: ‘Se aprouvesse a Deus chamar-me neste momento, teria que temer o olhar de alguém, ao entrar de novo no mundo dos Espíritos, onde nada pode ser ocultado?’

O Livro dos Espíritos, questão 919 a.

Nesse contexto, Santo Agostinho traz as perguntas como forma de nos autoconhecermos. Dessa maneira, podemos entender que o autoquestionamento serve como forma prática de nos autoconhecermos, entendendo atitudes e planejando ações.

As perguntas para o Autoconhecimento

Isto posto, podemos analisar a efetividade da utilização de perguntas para a extração ou obtenção de conhecimento em diferentes momentos do Espiritismo e do Cristianismo.

A primeira evidência está no Livro dos Espíritos. Kardec com apenas 1019 perguntas consegue sintetizar verdades sobre o universo, sondando as realidades do infinito e trazendo revelações para nossas caminhadas evolutivas.

Outra evidência muito forte está no Evangelho de Jesus. Para este caso, vale citar a obra As perguntas de Jesus, do autor Felipe Truccolo Mascarenhas. Nesta obra, Felipe traz reflexões e indagações em cima dessas perguntas que Jesus fazia aos seus discípulos. Estas perguntas do Mestre sondavam o interior de cada criatura, trazendo convites para a expansão de nossos conceitos e convicções.

No livro, o autor cita que:

“Quando o Cristo pergunta, fala ao Espírito imortal, viajor do Universo”.

— As perguntas de Jesus.

Dessa forma, a utilização de perguntas pelo Mestre Jesus traz nas entrelinhas um chamado para a interiorização e lapidação interna. Dessa forma, as perguntas, quando utilizadas para o autoconhecimento, podem ser um meio muito útil e eficiente.

Quem sou eu?

Em suma, podemos seguir a sugestão de Santo Agostinho por meio de questionamentos internos rotineiros. Nesse sentido, podemos tentar trazer às nossas reflexões a pergunta “Quem sou eu?”.

Ao nos perguntarmos isso, podemos fazer uma análise muito profunda e íntima, com foco no meu “eu” imortal (Espírito). Ao nos perguntarmos quem somos, estamos perguntando também:

  • Onde estamos em nosso processo evolutivo?
  • Qual o meu grau de entendimento das Leis Divinas?
  • Quais os meus defeitos? Quais as qualidades?
  • O que me torna um ser individual?
  • Que atitudes cristãs estamos tomando no nosso cotidiano?

Em vista disso, é possível fazer um acompanhamento rigoroso de nossas ações, pensamentos e ideias. Em especial, podemos tentar aplicar todos os conhecimentos cristãos trazidos pelo Cristo ao analisarmos criteriosamente nossas atitudes e ideias durante o dia.

Atitudes Cristãs

Ao pensarmos nas atitudes cristãs, vale lembrar o que seriam essas atitudes cristãs. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, podemos encontrar esclarecimentos:

“[…] A história da cristandade fala de mártires que se encaminhavam alegres para o suplício. Hoje, na vossa sociedade, para serdes cristãos, não se vos faz mister nem o holocausto do martírio, nem o sacrifício da vida, mas única e exclusivamente o sacrifício do vosso egoísmo, do vosso orgulho e da vossa vaidade. Triunfareis, se a caridade vos inspirar e vos sustentar a fé”

— O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XI, Amar o próximo como a si mesmo, item 13.

Por meio dessa explanação, podemos observar que a prática cristã está totalmente relacionada com a superação do egoísmo, orgulho e vaidade, o que nada mais é que o processo de Autoconhecimento. Necessitamos dessa avaliação de nossa atitudes para perceber onde cometemos faltas.

Nesse sentido, podemos pensar em diversos exemplos dentro do Cristianismo que nos exemplificaram a verdadeira prática das atitudes cristãs. A história de Joana de Cusa, em especial, é muito rica e complementa nossa construção até o momento. Iniciaremos o relato quando Joana e seu filho estavam prestes a serem queimados por conta da crença da mãe. 

O filho, em desespero, implora para que Joana abrisse mão de sua crença para que eles pudessem permanecer vivos. Como um primeiro exemplo de certeza e pleno autoconhecimento, Joana de Cusa pede que o filho se cale, pois que era necessário que os dois passassem por aquela situação.

Mais tarde, um dos verdugos pergunta à Joana:

“O teu Cristo soube apenas ensinar-te a morrer?”

— Boa Nova, Cap. 15, Joana de Cusa

E o relato segue:

“A velha discípula, concentrando a sua capacidade de resistência, teve ainda forças para murmurar:
– Não apenas a morrer, mas também a vos amar!…
Nesse instante, sentiu que a mão consoladora do Mestre lhe tocava suavemente os ombros, e lhe escutou a voz carinhosa e inesquecível:
– Tem bom ânimo!… Juana Eu aqui estou!…”

— Boa Nova, Cap. 15, Joana de Cusa.

Assim, uma simples pergunta foi o suficiente para que Joana de Cusa entrasse em contato com a consciência de seu Espírito imortal, entendendo que aquele que a maltratava hoje era, em verdade, seu irmão, merecedor de amor e compaixão. 

Brilhai a vossa luz

Por fim, Jesus nos deu mais um recado importante em relação ao autoconhecimento. Jesus nos instrui:

“Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus.”

— Mateus 5:16.

Dessa forma, o convite que fica é que possamos, justamente, brilhar a nossa luz, entrando em contato com nosso íntimo, nossa consciêcia, a centelha divina que reside em nós. Que possamos utilizar da melhor forma as ferramentas que nos ajudam a atingir essa autoiluminação, evoluindo sempre rumo ao progresso.

Acompanhe a íntegra da palestra que inspirou esta publicação:

Referências Bibliográficas:

  1. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro.
  2. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro, 131ª edição, 2013.
  3. FRANCO, Divaldo Pereira. Autodescobrimento, uma busca interior. Pelo Espírito de Joanna Ângelis.
  4. MASCARENHAS, Felipe Truccolo. As perguntas de Jesus. 1ª edição, Fergs editora.
  5. XAVIER, Francisco Cândido. Boa Nova. Pelo Espírito Humberto de Campos. Federação Espírita Brasileira, 20ª edição.
  6. Evangelho de Mateus.

* Colaborou com esta publicação: Alberto Luz.

Categorias: Notícias

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *