Queridos companheiros de leitura e estudo, antes de analisarmos o assunto deste texto, façamos uma pequena reflexão a respeito da fé, da amplitude dessa palavra e do que ela representa. Olhando dentro de nós e para fora de nós, somos portadores daquela fé inabalável que nos faz ter a certeza de que aqui estamos provisoriamente e que todas as experiências nada mais são que provas dessa fé. 

Na questão 354 do livro O Consolador, temos a orientação que: 

A fé não pode estagnar em nenhuma circunstância da vida e sabe trabalhar sempre, intensificando a amplitude de sua iluminação, pela dor ou pela responsabilidade, pelo esforço e pelo dever cumprido.
— Emmanuel, no livro O Consolador, questão 354.

Com base nesta reflexão inicial, vejamos uma das curas de Jesus, através do texto “A mulher Cananeia”: 

Saindo daquele lugar, Jesus retirou-se para a região de Tiro e de Sidom.
Uma mulher cananeia, natural dali, veio a ele, gritando: “Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de mim! Minha filha está endemoninhada e está sofrendo muito”.
Mas Jesus não lhe respondeu palavra. Então seus discípulos se aproximaram dele e pediram: “Manda-a embora, pois vem gritando atrás de nós”.
Ele respondeu: “Eu fui enviado apenas às ovelhas perdidas de Israel”.
A mulher veio, adorou-o de joelhos e disse: “Senhor, ajuda-me!”
Ele respondeu: “Não é certo tirar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos”.
Disse ela, porém: “Sim, Senhor, mas até os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos”.
Jesus respondeu: “Mulher, grande é a sua fé! Seja conforme você deseja”. E, naquele mesmo instante, a sua filha foi curada.
— Mateus 15:21-28.

Contexto histórico da cananeia

É necessário que tenhamos o entendimento de que, naquela época, Israel tinha como crença o Deus único. Ou seja, já tinham a base para abrigar a palavra de Jesus. Eram também o povo mais necessitado dessa palavra pela presença forte do orgulho. 

As regiões do entorno (siro-fenícia e siro-palestina), que são os cananeus (basicamente, comerciantes), eram politeístas, mas já tinham ouvido falar de Jesus e havia certa curiosidade em relação ao Mestre. 

Quando a mulher faz sua forte rogativa inicial pela filhinha e Jesus responde dizendo que foi enviado senão às ovelhas perdidas de Israel, o mestre estava passando a lição de que, inicialmente, veio plantar a semente do Evangelho e que outros se encarregariam de cuidar dela, até abranger a Humanidade inteira. Ou seja, já que nada é por acaso, Jesus saiu da Galiléia e entrou nessa região por um motivo real e forte. Essa mulher, uma estrangeira, clama, com humildade, dizendo: “Senhor”. Ela acreditava que o Mestre poderia curar e que a enfermidade de sua filha vinha da influência de espíritos. Jesus, através de sua moralidade e de suas mensagens mostrava a força que a cura tem e que as dificuldades têm um motivo.

Os apóstolos tentam dispensar a mulher por ser sírio-fenícia. Jesus esperava que o coração dos companheiros fosse tocado. Quando Ele fala novamente, deixa claro que o povo de Israel necessitava primeiramente da palavra de amor, mas que os gentios seriam alcançados posteriormente. 

Podemos dar o exemplo de Paulo, que antes de ver Jesus na estrada de Damasco, era doutor da lei e acreditava que meios drásticos podiam ser utilizados para demonstrar a supremacia das leis mosaicas. Quando ouviu Jesus, transformou-se e fez o trabalho da disseminação das lições morais passadas pelo Mestre. Até hoje, são ensinamentos necessários para que possamos “amar a Deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo”. O Livro dos Espíritos nos instrui: “amai-vos uns aos outros, eis toda a lei, divina lei, pela qual Deus governa os mundos”.

Exemplo de fé

A mulher cananeia não era uma ovelha de Israel, mas era perseverante. Ela se dedicava com afinco à sua filhinha e era persistente naquilo que acreditava. Com humildade, pediu ao Mestre que a socorresse. Fez um exercício de fé profunda ao voltar a suplicar a Jesus. 

Quando exercemos nossa fé, acreditando que conseguiremos atingir nossos objetivos experimentamos a nossa vontade de conseguir, de amadurecer, de evoluir, sem fugir de nossas provas, que fazem parte de nosso processo de crescimento moral. Se trata também de não desistir jamais, como muitas pessoas o fazem pensando em acabar com seu sofrimento, o que só traz dificuldades mais acentuadas para superar a dor, que não passa de um caminho para a evolução. 

A mulher cananeia demonstra uma fé inabalável diante da aparente negativa de Jesus de auxiliá-la. Ela não desiste, mesmo não sabendo dos objetivos do Mestre e de seus ensinamentos. Não foi o acaso que levou Jesus até a entrada da cidade de Sidom. Mas, embora aquela mulher não soubesse o que viria, dentro dela a fé era sincera e forte. Jesus sabia de sua fé e também sabia do orgulho israelita e o desprezo que se voltava ao estrangeiro.

Jesus diz: “não é bom pegar no pão dos filhos e deixá-lo aos cachorrinhos”. Os cachorrinhos, segundo Amélia Rodrigues, eram aqueles que não tinham a crença do Deus único e que tinham concepções bem diferentes da mensagem que Jesus trazia. E os filhos, eram aqueles que não pertenciam a essa aceitação da crença em vários deuses.

Mesmo assim, a mulher cananeia não desiste, mesmo sabendo que não fazia parte do contexto dos que aceitavam a palavra de Jesus. E a resposta da mulher vai ao encontro do que Jesus queria passar naquele momento: a mensagem se destinava a Israel, onde a dureza da lei e o orgulho preponderavam, mas o seu reino abrangeria a terra toda, ou seja, os ensinamentos seriam e são para todos, até para aqueles que ainda não creem.

Por que Jesus não atendeu de imediato?

Jesus, grande pedagogo, estava passando a lição da humildade e da fé, para toda a humanidade. A humildade, como antídoto do comportamento que o povo de Israel trazia, que é o orgulho. E a fé que traz a cura para si mesmo ou seja, para uma cura intercessória. A fé que move tudo diante das dificuldades interiores e também das dificuldades que se nos apresentam diariamente, sem desistir jamais. 

E, vejamos que, mesmo a mulher cananeia não trazendo a crença oriunda de Israel, ela se faz humilde, pedindo com modéstia e simplicidade, apesar da resposta aparentemente negativa de Jesus. Quem tem humildade, persegue aquilo em que acredita, sem se sentir fadigado ou diminuído.

A mulher sírio-fenícia, ao responder: “Sim senhor, mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos”, demonstrou uma fé incondicional no Mestre, mesmo não sendo uma mulher de Israel.

Entendemos então a “reserva” de Jesus, pois Ele aguardava a iniciativa da mulher cananeia em vencer a idolatria, e ter o merecimento para ser atendida. O povo judeu necessitou de uma preparação para receber a boa nova. Os gentios seriam esclarecidos posteriormente através do apóstolo Paulo e demais propagadores do Cristianismo primitivo. O Espiritismo esclarece que necessitamos do necessário tempo para desenvolvermos os nossos valores morais e intelectuais. Que a humildade e a fé dessa mulher cananeia possa nos inspirar, valorizando nossa presente encarnação.

A mulher cananeia simboliza todas as nações da terra, que um dia acorrerão a abraçar a prática da caridade e do amor, que aprendemos no Evangelho. Jesus plantou a semente do Evangelho, outros se encarregariam de cuidar dela.

Enfim, o tema central desta passagem é a fé, a superação, a importância da humildade. Característica necessária a todo aquele que deseja auxiliar, acolher e orientar os mais fragilizados, em busca da verdadeira cura, através do amor e da justiça, instrumentos da misericórdia divina para educar o Espírito em constante evolução moral. 

Acompanhe agora a íntegra da palestra que inspirou esta publicação:

Referências:

  • FRANCO, Divaldo. PRIMÍCIAS DO REINO. Lição 8. Por Amélia Rodrigues.
  • O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO. Cap. XIX. Item 2.
  • O LIVRO DOS ESPÍRITOS. Cap. XI. Questão 888-a.
  • RIGONATTI, Eliseu. O EVANGELHO DOS HUMILDES. Cap. 15.
  • XAVIER, Francisco Cândido. O CONSOLADOR. Questão 354. Por Emmanuel.

*Colaborou para esta publicação: Susana Rodrigues.
**Imagem em destaque via pexels.com

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