Em palestra transmitida pelos canais digitais da Associação Espirita Fé e Caridade, a expositora Claudia nos traz reflexões sobre capítulo VIII do Evangelho segundo o Espiritismo, mais especificamente no subitem chamado Pecado por pensamento e adultério.

Pecado por pensamento

No itens 5 e 6 desse capítulo, Allan Kardec nos traz a passagem presente nos Evangelhos de Mateus e de Marcos:

Aprendestes que foi dito aos antigos: “Não cometereis adultério. Eu, porém, vos digo que aquele que houver olhado uma mulher, com mau desejo para com ela, já em seu coração cometeu adultério com ela.” (S. Mateus, 5:27 e 28.)

A palavra adultério não deve absolutamente ser entendida aqui no sentido exclusivo da acepção que lhe é própria, porém, num sentido mais geral. Muitas vezes Jesus a empregou por extensão, para designar o mal, o pecado, todo e qualquer pensamento mau, como, por exemplo, nesta passagem: “Porquanto se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, dentre esta raça adúltera e pecadora, o Filho do homem também se envergonhará dele, quando vier acompanhado dos santos anjos, na glória de seu Pai.” (S. Marcos, 8:38.)
— O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo VIII, “Bem-aventurados os que tem puro coração”.

Jesus, na primeira passagem, já amplia o sentido literal de adultério. Mesmo que usando a concepção de traição conjungal, traz a responsabilidade para o indivíduo que realiza o adultério por pensamento. Ou seja, embora a ação não tenha se concretizado, o olhar com más intenções para outrém já configura como.

Nesse sentido, Kardec ressalta a importância do pensamento para a pureza de coração:

A verdadeira pureza não está somente nos atos; está também no pensamento, porquanto aquele que tem puro o coração, nem sequer pensa no mal. Foi o que Jesus quis dizer: ele condena o pecado, mesmo em pensamento, porque é sinal de impureza.
— O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo VIII, “Bem-aventurados os que tem puro coração”.

O que é pecar?

O significado de pecado no dicionário remete a infração das leis divinas, violação de um preceito religioso, desobediência a uma norma, ou ainda falta, erro.

Algumas religiões entendem o pecado como uma ofensa contra Deus, que revida mediante o castigo que inflige ao pecador.

Contudo, uma análise sistemática das obras de Kardec revela que, nelas, o pecado comporta uma leitura bastante diversa.

Para isso, é importante identificar qual concepção de Deus emerge do texto kardequiano. Afinal, como ressaltado em A Gênese, capítulo I, item 24: Deus constitui o “eixo de todas as crenças religiosas e o objetivo de todos os cultos”, razão pela qual “o caráter de todas as religiões é conforme à ideia que elas dão de Deus.”

Jesus inovou o pensamento religioso ao apresentar Deus como um Pai bondoso e justo, em substituição à figura colérica, vingativa e caprichosa que então predominava.

O Livro dos Espíritos apresenta-o como uma inteligência cósmica Suprema, infinitamente perfeita e que rege o Universo com base em leis igualmente perfeitas, plenas de justiça e misericórdia. Eis que Deus surge despido de caracteres antropomórficos, sem os vícios e as paixões humanas.

Portanto, podemos concluir que Deus não castiga.

O pecado para doutrina espírita configura no sentido de erro ou desvio perante a Lei Divina. E essa lei abrange a Lei de Causa e Efeito. Quando nos desviamos da Lei de Deus, nos afastamos da felicidade que é cumprí-la (O Livro dos Espíritos, questão 614).

Assim, o comportamento adotado, por cada um ao longo de sua escalada evolutiva, é que ocasiona automaticamente consequências correspondentes. 

E o que se pode entender da palavra PENSAMENTO?

Através dos estudos das obras básicas de Allan Kardec, encontram-se várias fontes sobre o pensamento. 

Na obra O Céu e o Inferno, vemos claramente porquê precisamos estudar tanto sobre o pensamento. Em A Gênese e Obras Póstumas entedemos que o pensamento se concretiza por meio da movimentação de energias. Já em O Livro dos Espiritos, sabemos que nós encarnados não conseguimos ver os pensamentos, mas os desencarnados sim. E no Evangelho segundo o Espiritismo aprendemos que somos responsáveis pelo o que pensamos, tanto quanto pelo o que fazemos.

Pensamento, em O livro dos Espíritos

A expositora nos assinala algumas questões de O Livro dos Espíritos, que transcrevemos a seguir:

282. Como se comunicam entre si os Espíritos?

“Eles se vêem e se compreendem. A palavra é material: é o reflexo do Espírito. O fluido universal estabelece entre eles constante comunicação; é o veículo da transmissão de seus pensamentos, como, para vós, o ar o é do som. É uma espécie de telégrafo universal, que liga todos os mundos e permite que os Espíritos se correspondam de um mundo a outro.”
— O Livro dos Espíritos, Parte Segunda, capítulo VI, “Da vida espírita”, subitem “As relações no além-túmulo”.

O fato de nós, encarnados, não conseguirmos ler os pensamentos dos outros nos protege e auxilia nos resgates que necessitamos em nossa evolução. Muitas vezes, ainda não estamos preparados para lidar com os pensamentos alheios. Assim como, seria mais complexo os outros poderem saber tudo o que estamos pensando. Será que nos sentiríamos envergonhados?

Mas embora isso não ocorra de forma geral entre os encarnados, entre os desencarnados não é possível dissimular os pensamentos. E os desencarnados, em relação a nós, conseguem ler nossos pensamentos, como explica as questões seguintes:

457. Podem os Espíritos conhecer os nossos mais secretos pensamentos?

“Muitas vezes chegam a conhecer o que desejaríeis ocultar de vós mesmos. Nem atos, nem pensamentos se lhes podem dissimular.”

458. Que pensam de nós os Espíritos que nos cercam e observam?

“Depende. Os levianos riem das pequenas partidas que vos pregam e zombam das vossas impaciências. Os Espíritos sérios se condoem dos vossos reveses e procuram ajudar.
— O Livro dos Espíritos, Parte Segunda, capítulo IX, “Da intervenção dos Espíritos no mundo corporal”, subitem “Faculdade, que têm os Espíritos, de penetrar os nossos pensamentos”.

Compreeendendo que até nossos pensamentos são observados, será que temos controle sobre nossos pensamentos? Vejamos as seguintes questões:

833. Há no homem qualquer coisa que escape a todo constrangimento, e pela qual ele goze de uma liberdade absoluta?

— É pelo pensamento que o homem goza de uma liberdade sem limites, porque o pensamento não conhece entraves. Pode-se impedir a sua manifestação, mas não aniquilá-lo.

834. O homem é responsável pelo seu pensamento?

— Ele é responsável perante Deus. Só Deus, podendo conhecê-lo, condena-o ou absolve-o, segundo a sua justiça.
— O Livro dos Espíritos, Parte Segunda, capítulo IX, “Da intervenção dos Espíritos no mundo corporal”, subitem “Faculdade, que têm os Espíritos, de penetrar os nossos pensamentos”.

Sabendo, então, que somos, responsáveis por nossos pensamentos, é de tamanha importância o “Orai e Vigiai” sempre. Pois é a partir daí que passamos a repelir os maus pensamentos.

Trabalhemos os sentimentos que suscitam em nós. Por exemplo, se sentimos raiva perante quem tenta nos desviar do caminho, tenhamos consciência de que o que o outro faz e fala sempre será responsabilidade dele. Os maus pensamentos advindos da raiva prejudicam principalmente a uma pessoa: a nós mesmos!

Por isso é importante acolher os sentimentos, buscando enteder o que ele quer nos trazer, porém com pensamentos que tragam equilíbrio e autoregulação emocional.

Façamos uso da prece diária, ela sempre será o bálsamo para nossas feridas.

Assim estaremos mais em sintonia com os espíritos bons, e maior será nosso aprendizado.

Pensamento, em O Evangelho segundo o Espiritismo

Todo pensamento mau resulta, pois, da imperfeição da alma; mas, de acordo com o desejo que alimenta de depurar-se, mesmo esse mau pensamento se lhe torna uma ocasião de adiantar-se, porque ela o repele com energia. 

Kardec também diz que depois que resistimos a uma tentação sugerida pelo pensamento, nos sentiremos mais fortes e contentes com nossa vitória. Explicando que:

…naquele que nem sequer concebe a ideia do mal, já há progresso realizado; naquele a quem essa ideia ocorre, mas que a repele, há progresso em vias de realizar-se; naquele, finalmente, que pensa no mal e nesse pensamento se compraz, o mal ainda existe na plenitude da sua força.
Num, o trabalho está feito; no outro, está por fazer-se. Deus, que é justo, leva em conta todas essas gradações na responsabilidade dos atos e dos pensamentos do homem.
— O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo VIII, “Bem-aventurados os que tem puro coração”.

Pensamento, em A Gênese

Não temos nem ideia do quanto nós influenciamos e somos influenciados pelos pensamentos. Os pensamentos são como os sons de um sino que fazem vibrar todas as moléculas que estão no ambiente. 

Os espíritos atuam sobre os fluidos espirituais empregando seu pensamento e vontade. 

Os fluidos espirituais, que constituem um dos estados do fluido cósmico universal, são, a bem dizer, a atmosfera dos seres espirituais; o elemento donde eles tiram os materiais sobre que operam; (…)
— A Gênese, capítulo XIV, “Os fluidos”, item 13.

Assim, para os Espíritos, o pensamento e a vontade são análogos às mãos para os homens encarnados.

Pelo pensamento, eles imprimem àqueles fluidos tal ou qual direção, os aglomeram, combinam ou dispersam, organizam com eles conjuntos que apresentam uma aparência, uma forma, uma coloração determinadas; mudam-lhes as propriedades, como um químico muda a dos gases ou de outros corpos, combinando-os segundo certas leis. É a grande oficina ou laboratório da vida espiritual.
— A Gênese, capítulo XIV, “Os fluidos”, item 14.

Nossos pensamentos tormam forma, como as obras de André Luiz explicam mais à respeito.

Pensamento, em O Céu e Inferno

No capítulo II do livro, chamado Espíritos felizes, temos a carta do Sr. Sanson, antigo membro da Sociedade Espírita de Paris, que desencarnou e depois veio a se comunicar com os antigos colegas. Assim, Kardec e demais membros lhe fazem algumas perguntas como a que segue:

13. Dizeis que ledes em nosso pensamento; poderíeis fazer-nos compreender como se opera essa transmissão de pensamento?

– Resp. Isso não é fácil; para vos dizer, vos explicar esse prodígio singular da visão dos Espíritos, seria preciso abrir-vos todo um arsenal de agentes novos, e seríeis tão sábios quanto nós, o que não é possível, visto que vossas faculdades são limitadas pela matéria. Paciência! Tornai-vos bons, e chegareis lá; não tendes atualmente senão o que Deus vos concede, mas com a esperança de progredir continuamente; mais tarde sereis como nós. Tentai então morrer bem para saber muito. A curiosidade, que é o estimulante do homem pensante, vos conduz tranquilamente até a morte, reservando-vos a satisfação de todas as vossas curiosidades passadas, presentes e futuras.

Enquanto se espera, dir-vos-ei para responder bem ou mal à vossa questão: O ar que vos rodeia, impalpável como nós, leva o caráter de vosso pensamento; o hálito que exalais é, por assim dizer, a página escrita de vossos pensamentos; eles são lidos, comentados pelos Espíritos que se chocam convosco incessantemente; eles são os mensageiros de uma telegrafia divina a que nada escapa.

Assim, embora fica explicitado que ainda não conseguimos compreender a fundo mecanismos da transmissão do pensamento, certo é que devemos cuidar do nosso bom hálito mental. 

Pensamento e hálito mental

No livro Estudando a Mediunidade, de Martins Peralva, o escritor e espírita brasileiro explica um pouco sobre a nossa mente.

Assim como temos um hálito bucal, em função do que passa pela nossa boca no processo digestivo, nós temos um “hálito mental”,  em função dos pensamentos que transitam pela nossa mente.

Esse “hálito”, isto é, essa irradiação das idéias que cultivamos, é percebido pelos espíritos (pode até ser percebido por médiuns) que poderão ser atraídos por ele, quando há similaridade.

Se cultivamos bons pensamentos e ideias construtivas, atraímos bons espíritos; se nos habituamos a produzir ou aceitar pensamentos inferiores, vulgares, atraímos espíritos inferiores, vulgares.

Espíritos superiores têm dificuldade em manifestar-se através de um médium que não cuida da sua higiene mental (não se pede aqui, nenhuma santidade); espíritos inferiores têm dificuldade e evitam utilizar mentes que se esforçam para captar o que há de melhor no ambiente espiritual, onde as irradiações mentais se cruzam, se entrelaçam. A mediunidade começa na disciplina da nossa mente.

Diante disso, você já parou para pensar em quantas vezes a sua “carne foi fraca”? A mensagem de Cristo é extremamente valiosa para refletirmos sobre o esforço que temos feito aqui na Terra para vencer essa debilidade.

Nos conhecendo, iremos empreender uma árdua jornada de reconstituição das nossas estruturas emocionais, através de afanoso trabalho disciplinar dos pensamentos e ações. Só assim, alcançaremos a paz e o bem estar.

Acompanhe agora a íntegra da palestra que inspirou esta publicação:

Referências bibliográficas:

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 93. ed. Brasília: FEB, 2013. Parte Segunda.
  • Id. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 125. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap.18 (Bem aventurados os que tem puro o coração).
  • Id. A Gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. 50. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. Cap. 1 e 14.
Categorias: Notícias

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